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Só há luto onde há amor

  • Foto do escritor: Patricia Sousa
    Patricia Sousa
  • 22 de fev. de 2021
  • 5 min de leitura

Parece contraditório? Mas não é! Só vive e passa pelo luto quem ama. Há muitas teorias. Teorias de nomes bem conhecidos da nossa história, mas nenhuma teoria explica o luto. Sabes porquê? Porque a experiência de viver o luto é tão, mas tão, única. Só quem vive é que sabe e cada um de nós vive à sua maneira. Tal como o amor, o luto é uma experiência viva e que não se consegue explicar.


Nunca estamos preparados para perder quem amamos. Muito menos de forma inesperada e trágica. Mas também não dá para nos preparar para perder alguém que amamos, não é? Vivemos na ilusão de que aqueles que nós amamos nunca vão partir ou vivemos eternamente com medo que esse dia chegue. Negamos a única certeza que temos. Podemos estar mais evoluídos espiritualmente e saber que somos seres espirituais vivendo uma experiência humana. Podemos saber que o desapego é crucial para vivermos de forma saudável. Mas o que fazemos com a saudade e a falta que sentimos da pessoa, que estava tão presente no nosso dia?



“Mesmo sabendo que um dia a vida acaba, nós nunca estamos preparados para perder alguém.”

Nicholas Sparks


Não há uma receita para lidar com a perda nem com o luto. Cada um vive o luto à sua maneira e cada experiência é vivida de forma diferente, dependendo da relação que temos com a pessoa que partiu, do momento da nossa vida, da nossa personalidade, na nossa fé (não estou a referir-me a nenhuma religião!) e das circunstâncias em que a morte acontece. Cada um vive à sua maneira e da maneira que sabe. Mas é, sem dúvida, uma das provas mais duras da nossa vida.


Perdi os meus avós muito nova. A morte da minha avó materna marcou-me profundamente. Vivi o meu luto. Doeu? Muito. Precisei de muito tempo? Claro que sim! Mas consegui cicatrizar a ferida. Sabes porquê? Perder a minha avó era expectável. Ela estava doente e eu sabia que isso ia acontecer mais dia menos dia. Entretanto, eu estava no auge dos meus sonhos. Estava no início da minha carreira profissional, cheia de projectos e com uma vida extra-profissional recheada de vida e de pessoas. Hoje, consigo recordar com aquela “saudade boa” tudo o que vivemos juntas e sinto-me uma privilegiada por a ter tido na minha vida!


Perdi, entretanto, um grande amigo e o meu pai, no espaço de um ano. Ainda estou a viver o luto! Sabes porquê? Não era expectável, muito menos da forma que as duas mortes aconteceram. A entrada nos meus 40 anos foi tudo menos aquilo que algum dia sonhei para a minha vida: não cumpri a ‘check list da felicidade’ que a sociedade nos impõe desde muito pequenos. À frustração e ao sentimento de ter falhado juntou-se a perda de um amigo muito importante na minha vida e da pessoa que mais amava, o meu pai. Fui literalmente atirada (nas duas situações), à má fé e sem aviso, para o fundo de um buraco bem escuro e muito frio.


Dizem que o luto tem várias fases, mas para mim o luto não é nenhuma corrida de obstáculos, que chegamos ao fim e fica tudo bem e até podemos ganhar uma medalha. O luto é uma autêntica montanha russa. Hoje de manhã estou bem e da parte da tarde, à mínima coisa, dou uma queda vertiginosa e, sem protecção, caio daquela montanha russa a pique. Frequentemente sinto-me mergulhada numa espécie de confusão. Muitas vezes, perco-me nas memórias, tão boas e felizes! Quase sempre sinto tantas, mas tantas saudades! Sinto-me órfã. Sinto-me desprotegida. Sinto-me abandonada. Muitos outros filhos, pais, maridos, esposas, netos, avós, primos e tios e, claro, amigos sentem o mesmo.


Muitos outros que estão à nossa volta não compreendem. Sabes porquê? Porque nunca perderam ninguém que amam. Por vezes, é difícil colocar-nos no lugar do outro. Mas bastava questionarem-se como seria se perdessem a pessoa que mais amam e deixavam de julgar ou de querer acelerar o processo de luto da outra pessoa. Por isso, nós que estamos a passar por este processo aprendemos a relativizar o que nos vai acontecendo. Por isso, que os queixumes, os discursos de vitimização e as constantes reclamações dos outros começam a fazer-nos comichão. Aí se eles soubessem!


O luto é um período indispensável, que precisa ser bem vivido e, por isso, não deve ser apressado ou interrompido. Quando nos dizem “segue em frente, já não podes fazer nada” não estão a ajudar, mas apenas a acelerar algo que tem que ser vivido. Aí se eles soubessem!


Tenho saudades de abraçar. Sou de abraços e de afectos. Mas, contrariando a minha essência, o período que supostamente mais precisava de abraços na minha vida não tive abraços (e depois veio a Covid-19). Isolei-me de tudo e de todos. A revolta, a tristeza e a dor eram tão grandes que não queria ouvir ninguém dizer-me “tens de seguir em frente”, “o teu pai de certeza que quer que tu estejas bem”, “não podias fazer mais nada” e tantas outras frases que na hora só apetece pedir à pessoa para se calar e desaparecermos. Porra? Porque é que ninguém chega à nossa beira nos dá um abraço e fala que é normal e natural estar assim? O luto é isto. Precisa de abraços e que falemos dele abertamente. Das fragilidades, das vulnerabilidades, das dores, das saudades. Normalizar aquilo que é natural e que todos teimamos em esconder para debaixo do tapete. Independentemente daquilo que acreditamos, o certo é que quando amamos sentimos falta. Sentimos saudade. Sentimos um vazio e um buraco escuro (que acredito que um dia vai ficar cinzento) no lugar do coração e é preciso olhar para ele com amor, gentileza e muitos abraços. Sabes porquê? Porque quando alguém que amamos parte, uma parte de nós também vai com ela. Nunca mais nada é igual. Daí a necessidade de adaptação e de recomeçar! É um processo, que cada um conduz como sabe e como pode. Infelizmente, quase sempre sozinho.


A ti, que estás a viver o luto como eu: não estás sozinha/o! Confia! Acredita! Sabes porquê? O amor supera tudo!


“Apenas as pessoas que são capazes de amar fortemente podem sofrer grande tristeza, mas esta mesma necessidade de amar serve para neutralizar a sua dor e curar.”

Leon Tolstói


Daqui para a frente, também vou partilhar contigo outras temáticas relacionadas com o luto, dos momentos felizes que podemos e devemos viver sem culpa, da transformação natural, porque a nossa vida nunca mais é igual, e de algumas das estratégias que me têm permitido voltar a subir a montanha russa e manter-me minimamente equilibrada no meio desta luta. Quem sabe até, partilhe testemunhos teus (mesmo que seja de forma anónima). Seria transformador! Sabes porquê? A partilha tem poderes mágicos e podemos ‘dar a mão’ a quem mais precisa com o nosso testemunho, experiência e vivência! Esta é também uma forma poderosa de nos ajudar, ajudando o outro! Pensa nisso! Vamos falar de luto?

Por enquanto, que venham os abraços, como a minha pequena Mariana diz, “apertadinhos e demorados”!


Um abraço apertadinho

Com amor

Patrícia


PS: Esta semana não consegui gravar vídeo. Este tema ainda é muito doloroso para mim e, por isso, não consegui me expor em frente a uma câmara. Mas eu chego lá!!!

 
 
 

1 comentario


luciajcanteiro
15 oct 2024

Tão verdade, perdi o meu marido há cinco anos e eu nunca mais fui a mesma, parte de mim morreu com ele. Todos me dizem que tenho que seguir em frente, que sou muito nova (50anos) que a vida continua, que o tempo cura tudo… Mas eu não acho nada disso. O tempo não cura nada, a vida não continua e eu não consigo seguir em frente e deixar tudo para trás. Parte de mim já não existe, eu fiquei diferente e a saudade é tanta que tudo dói. Falta-me a força que a minha outra metade me dava, sinto-me incompreendida, sozinha e sem objetivos. Projetos que ficaram por concretizar, sonhos por realizar e um amor interrompido. Sinto saudades…

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